domingo, agosto 26, 2007

Inocência

Inocência

Peguei um dos meus antigos álbuns de fotos, daquelas que as bordas já estão amareladas e que todo dígito no verso começa com "198...". Achei uma que é, no mínimo, profética: meu primo de um lado, eu no meio com cara de idiota segurando um tufo de grama e fingindo que ia comer, e uma garota, que achávamos ser a última fruta do Jardim de Éden. Essa garota, da qual não lembro mais o nome, era minha "musa", porque sabia fritar pastéis. Os que eu gostava, os de "estambo limpo", segundo ela. Significava que o pastel não tinha recheio algum, só vento. Isso foi em Cupira, Pernambuco, em uma oportunidade nada inteligente em que meus pais tiveram a idéia de passar "uns dias" lá, na casa que meu tio havia comprado também sabe-se lá porque. Esses "dias", acabaram virando meses, e fiquei na cidade por um bimestre.
A casa do meu tio tinha uma pequena garagem na frente, uma sala bem grande, uma área maior ainda que não sei para que servia e cozinha. Os quartos eram tão grandes que dava para se perder dentro. Casa de cidade do interior de Pernambuco são assim mesmo, ainda mais, se custar mais de R$ 10 mil. As camas, em especial, tinham até sistema de massagem, com os sapos pulando debaixo dela, batendo a cabeça no colchão. O banheiro externo, único por sinal, também servia de abrigo de coacheiros, cobras e criaturas soturnas, como corujas. Havia um poço enorme no quintal dos fundos, onde além de nós acharmos que ná época havia um tubarão, era de onde provinha toda a água da casa.
Ainda me lembro da diversão que era matar sapos jogando sal em suas costas, amarrar morcegos em rojões e brincar de Comandos em Ação enquanto passava o cortejo fúnebre na rua do cemitério, a mesma da nossa casa. A mesma da nossa casa, da mercearia, do rio, da ponte e da esquina do colégio. Além disso, na cidade ainda se encontrava uma prefeitura que contava com porta-janela-armário de metal e mesinha e "o resto" (que hoje em dia eu sei que era mato e estrada). Voltando ao assunto dos cortejos, vale salientar que eram todos de crianças. Por semana, devia ter uns três. Caixões brancos e azuis, carregados nos ombros pelas ruas de terra e lama, acompanhados por cantigas e preçes. Era para ser uma cena bem traumática, se não fosse minha dose de sarcasmo já presente e bastente necessária na época. Lembro que uma vez minha mãe me deu a maior surra da minha vida, porque eu comentei que meu tênis tinha o mesmo símbolo da alça de um dos caixões. Nota: eu tinha um Ortopé, e sei lá porque, desenharam o bichinho da Ortopé do lado do caixão. Parecia uma caixa de cereal, eu não tive culpa por rir.

Bem, tudo isso é só para dizer que eu fiquei com "saudades" disso tudo. Não que queira para voltar para a cidade em forma de "T", mas que naquela época, era tudo tão mais legal... a gente acreditou que estávamos viajando para o exterior, só porque a viagem levou 3 dias de ônibus.

Ah, a inocência... que falta me faz!

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