quinta-feira, janeiro 11, 2007

A perda da inocência...

A perda da inocência...

Quando eu tinha meus 6 anos de idade, eu acreditava que a ladeira de casa era algo absurdamente grande. Eu demorava, em média, 15 segundos para descer aquilo tudo na minha Motoquinha Bandeirantes, devidamente silenciada por meu meu pai, que arrancara o plástico que vinha na roda e fazia o delicioso téc-téc-téc mais estridente e irritante que a voz da Joelma.
Certo dia, estava eu no topo da Rua Domingos Neto, me preparando para partir em alta velocidade, quando uma Fiorino branca, com um alto falante encima, passou pela rua:

"Mamães e papais, não esqueçam de levar seus filhinhos de até 7 anos para a vacinação!"

Na janela do passageiro, o amável Zé Gotinha mandava brasa nos acenos, beijinhos e gestos carinhosos para toda a criançada. Uns amigos meus, hoje alguns já presos ou mortos, se divertiam mostrando o dedo para aquele pingo branco ou mostrando a bunda. Quando ela já estava no fim da ladeira, lá embaixo, resolvi descer. Sinceramente, a sensação de velocidade era de uns 50km/h, mas talvez não passasse dos 15. Eu não entendia absolutamente nada sobre carros, mas sabia que a luz branca na lanterna era aquela que fazia meu pai gritar "- Lúcia, tira a porra desse moleque ae de trás, que eu vou sair!".

Só sei que não consegui me desviar a tempo e bati na traseira da Fiorino do posto de saúde, enquanto ela dava a ré para fazer sabe-se lá o que. Fui para debaixo do veículo, mais ou menos perto do escapamento. Minhas mãos e cotovelos, ardiam. Chorava feito um bezerro desmamado, mas sabia que nada de mal iria me acontecer, afinal, o amigo da molecada era o co-piloto do carro e haveria de me ajudar.

- Ô, moleque! Você é doido, é? Quer morrer?!
- ...hmmm...buáááááááá!!!
- Pára de chorar, ô, porra! Caralho! Moleque dos infernos!
- Buáááááááááááá, descuuuuulpaaaaa...!!!
[chega meu pai]
- Mas que merda tá acontecendo aqui?
- É seu filho esse menino? Ele veio "no maior pau" lá de cima, e bateu com tudo na traseira...

- Mentira, pai! (interrompi). - Ele tava dando ré na ladeira, "mó rápido!".

Sei que daí em diante, foram acusações mútuas. Meu pai, xingava o motorista de irresponsável, mesmo que ele nem tivesse saído do carro pra discutir. Eu, continuava chorando e preocupado com minha Tonquinha e, o ZG, só queria saber de ir embora dali.

- Olha, senhor... me desculpe... mas a culpa foi do teu filho!
- O que?! Mas você tá querendo apanhar, né?!
- Hahahaha, não me fale uma coisa dessas...


E foi nesse momento que minha infância acabou. Eu sabia que tinha sido meu pai que me deu o Atari no natal daquele ano (87 pra 88, se não me engano). Que se fodesse o Papai Noel, eu tinha até certo desprezo por aquele velho pançudo e de barba branca. Mas, ao tirar o capacete, descobrir que o Zé Gotinha era o borracheiro da oficina na esquina da Escola Cantinho da Alegria, onde eu estudava, foi demais.

Naquele ano eu não quis vacina de gotinha.
Tomei na bunda, mesmo. Infeliz e revoltado.

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